Monday, November 02, 2009

Pré-Chuva



Todo ano, com intensidade crescente, as chuvas inundam o Espírito Santo. Pequenas cidades do interior do estado perdem quase tudo que produziram com muito trabalho e dedicação. Em sua grande maioria são pessoas simples que lutam com muita dificuldade. Gente humilde, diria o poeta diplomata. Como se fossem repetitivas, as chuvas precipitam-se praticamente nas mesmas regiões e nos mesmos locais. A tragédia anunciada, mas sem data e horário determinado. Jornais e emissoras de televisão relatam dolorosamente o suplício de uma saudade do que tinham. Inclusive, em situações mais drásticas, de entes queridos. Perdas irreparáveis.

Desde 1970 sabemos da impiedosidade das águas pluviais enchendo rios e riachos, derrubando pontes, residências e imóveis comerciais. Perdas comerciais, humanas e sociais ampliam-se evidenciando a fragilidade de nossas cidades, o descaso com seu saneamento e sua ocupação desordenada. Também, evidenciam o descaso da administração pública, de forma geral, com as providências preventivas necessárias. O que seria o movimento articulado pré-chuva. Investimentos são adiados ou insuficientes. A logística de remoção de pessoas e habitações cessa tão logo cesse a chuva torrencial. A desobstrução de rios e canais fica para depois. Não há uma política pública estratégica que tenha essa visão. Passeios de helicóptero e sobrevôos acontecem todos os anos constatando o óbvio.

Ano passado, por exemplo, o Governo do estado sobrevoou Vila Velha e estampou manchetes nos jornais, concedeu entrevistas e sensibilizou-se com o mosaico de destruição e dor. Passou o tempo, vieram as eleições, a boa parceria com o Governo do Estado, as promessas de realizações e os eventos cívicos, festivos. As chuvas, lá de cima, observavam sem pressa. Imaginaram que teriam por onde correr este ano. Que algo seria feito para evitar novas inundações. Vereadores e deputados discursaram veementemente indignando-se com a situação dos desamparados. Prometeram agir firmemente para que as leis e o orçamento público estadual e municipal estimassem receitas e fixassem despesas que atenuassem essa situação.

Qual o quê. O quadro atual mostra que nada avançou. Aumentou apenas a nossa presença negativa nos noticiários nacionais. Presídios, o enfrentamento entre civis e policiais, corrupção, descontentamento entre oficiais militares, acervo que se deteriora e outras notícias indesejáveis. Continuamos com os mesmos vôos de helicóptero, novas lamentações e promessas políticas. Estamos todos preocupados com o Pré-Sal. Políticos, secretários de estado e empresários estão em vigília, dedicando-se aos números da riqueza negra. Enquanto isso, lágrimas humanas misturam-se às lágrimas da natureza, inundando a humildade, a pobreza e a alienação dos capixabas mais atingidos. Feliz será o dia em que haverá um esforço pré-chuva.

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