Antes de apertar o gatilho e
disparar o tiro mortal contra o próprio peito que o fez entrar para a História,
Vargas vislumbrou o futuro do Brasil. Repuxou o travesseiro alto e macio, de
fronha branca e bordada, acertou o pijama de listras longas e lançou o olhar
sobre o amanhã. Ficou pasmo com o que antevia.
Pensou em chamar a filha, que ainda estava no Palácio do Catete, mas preferiu a
solidão. O silêncio de sua decisão. Apenas o som do tiro disparado o quebrou. E
fechou a cortina do futuro.
Vargas viu a ascensão e a queda
de Juscelino Kubitschek, do apogeu da construção de Brasília à sua execração moral
e politica. Contemplou a construção da Praça dos Três poderes, símbolo de uma democracia
que se transformaria em frangalhos com o regime militar. De soslaio, acertando
as pontas dos pés sob os lençóis de linho branco, viu a chegada de Jânio, balançando
sua vassourinha com a promessa de acabar com a corrupção. Pelos vidros da janela,
viu a ida de Jango à China e o imbróglio da definição de quem assumiria a presidência
do país. Tentou entender o Parlamentarismo de Tancredo, mas lhe faltou
interesse.
Seguir viagem em direção ao
futuro o fez conhecer os porões da ditadura e os movimentos estudantis. Os
novos líderes políticos, estudantis e sindicais. Reviu Tancredo, presidente
eleito e acometido de grave doença. Rezou por ele em sua morte e defrontou-se
com Sarney e suas decisões antagônicas. Em seguida, viu a alegria do povo
brasileiro com as Diretas Já e sua angústia com o presidente eleito, Collor de
Melo. Vibrou quando o Congresso o afastou. Relembrando a sua visão automotiva, teve
vontade de dirigir o reinventado fusca de Itamar.
O Plano Real lhe fez pensar
nos pobres que, com ele, livraram-se da temida inflação. Nessa vereda do futuro, encontrou
Fernando Henrique, Lula e Dilma. Sentiu saudade da revolução de 1930. Estava a
ver, meio que contra a luz, o perfil de Temer. Depois de tudo, havia um mosaico
à sua frente. Desistiu de entendê-lo e entrou para a História.
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