
Recentemente escrevi em jornais um artigo intitulado “Ira Social”. Nele eu comentava que, frente ao incontestável aumento da insegurança pública em nosso Estado, cidadãos estariam se transformando em justiceiros e paladinos da justiça. São termos fortes e não quis generalizá-los. Mas, como expectador dos fatos que emolduram a nossa vil realidade, deixei-me levar pela sedução torpe das palavras e escrevi um texto indefensável. Afinal, em pleno ano de 2010, com a publicidade de um governo exemplar eu poderia estar sendo traído pela verve da inconformidade. Que nada. Assustadoramente, notícias de jornais estão acentuando minhas linhas com negrito sublinhado. Só para citar algumas, pouco mais de mês atrás, jovens que voltavam de uma festa, no município de Serra, lincharam um rapaz que havia acabado de roubar uma residência. Desconfiado da insegurança pública, o morador amarrou latas em uma bicicleta, como um alarme que soasse à entrada de assaltantes. Revelado, o gatuno tentou fugir, mas caiu nas mãos justiceiras de cidadãos comuns.
Recentemente também, outro meliante apanhou muito lá para os lados de Itapoã ou Itaparica, em Vila Velha. Saiu todo alquebrado, direto para o hospital. Cidadãos revoltados o espancaram. Agora, esses dias, os jornais noticiaram que um ladrão de relógio foi amarrado em um poste e espancado. Em pleno centro da capital de nosso Estado, à luz do dia. Foi salvo pelas próprias vítimas, pai e filho. A síndrome de Talião: olho por olho, dente por dente. As pessoas estão no limiar da racionalidade, estão com os nervos à flor da pele. Ansiosas, amedrontadas, angustiadas, desamparadas. Até a esposa de um desembargador não teve a quem recorrer após ser assaltada em pleno dia. Pessoas combativas como a representante da Associação dos Moradores da Ilha do Boi, estão jogando a toalha. Sim, o jargão é esse mesmo, pois parece uma luta de boxe. Estamos construindo um ringue hermético. Não se consegue sair dele incólume.
Extrapolando a área metropolitana, essa constatação se amplia pelo interior do Estado. A violência e a degradação moral fazendo seguidores. A imprensa faz o que pode, assume o seu papel de divulgação e cobrança por soluções, mas mesmo essa atitude – com a ineficiência e a impunidade que se observa no setor público – pode até estimular práticas criminosas. Marginais hoje desconhecidos podem até sonhar em ser capa da revista Veja ou estampar matérias jornalísticas e depois caminharem pelas ruas normalmente. Até jogadores de futebol, quem sabe. O cidadão que se proteja. Não ande com vidros do carro abertos, não pare em sinais de transito de noite, não deixe de pagar o flanelinha, não more mais em casas, evite usar ou carregar objetos de valor e não reaja. Eu quis tanto que inúmeras pessoas que me escreveram concordando com aquele meu texto anterior estivessem erradas. Que as autoridades públicas pensassem menos no enriquecimento financeiro de nosso Estado e valorizassem a qualidade de vida de seus cidadãos. A vida cotidiana parece indicar o contrário. Infelizmente, se tudo der certo, estaremos levando essa distorção social para o sul do Estado, no litoral mais belo que algum lugar possa ter. E desprezar.
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