Wednesday, February 10, 2010

Tratado dos Dormitórios


Recentemente, em A Gazeta, uma autoridade pública municipal vangloriou a construção de uma tendência em que Vila Velha deixaria de ser uma cidade dormitório e cresceria com a atração de indústrias e empresas de grande porte, principalmente. Ora, isso é exatamente o que inviabilizaria a cidade. Muitas cidades, hoje, buscam manter-se o mais “dormitório” possível, aderindo a sua vocação natural. Buscando a qualidade de vida. São cidades que enriquecem ou cumprem suas responsabilidades públicas com a receita da atividade econômica do setor terciário, de serviços. Nessas cidades, alem de dormirem bem, moradores e turistas gastam seu dinheiro com lazer, restaurantes, shoppings, esportes náuticos, teatros, cinemas e outras atividades pouco poluidoras e altamente rentáveis. Ainda, com ensino superior e escolas profissionalizantes. É até possível ter um Universidade Estadual onde hoje é o Vasco Coutinho, no Centro.
Dinheiro que ganham em áreas vizinhas, conurbadas, cheias de indústrias, onde trabalham. Mônaco, coitadinha, por exemplo, é uma cidade dormitório. Siena, Praga, Veneza e Cesk Krumilov, que pena, também. Nelas alem de morar, as pessoas vivem. Sem poluição mutilante, transito inesgotável e insegurança incontrolável. Vila Velha não precisa ocupar seus espaços urbanos com grandes empresas ou indústrias. Ao longo da Rodovia do Sol, por exemplo, está o hiato perfeito para condomínios residenciais horizontais. Na área rural, redes hoteleiras em forma de resorts, hotéis-fazenda, expansão do agroturismo e do agronegócio são pertinentes. O Vale Encantado pode expandir uma boa oferta residencial de qualidade alem de prestadores de serviços como Rodoviária, Corpo de Bombeiros e empresas de comércio exterior.
As cidades dormitório podem ganhar muito dinheiro com uma estruturada rede financeira, atraindo o núcleo estratégico de bancos e instituições financeiras. Ou, ainda, call centers, que empregam bastante. No Brasil já uma experiência de sucesso, com a utilização de espaços urbanos para a construção de cidades empresariais. Ali se concentram as sedes administrativas das grandes empresas. Compartilham segurança, logística, telecomunicações, treinamentos e energia. O núcleo decisório, a origem das estratégias competitivas pode estar ali, a trinta minutos do operacional. Bem melhor seria Vila Velha assim. Dormitório, com mais qualidade de vida, boa receita, ampla atratividade turística e forte produção acadêmica e cultural. A ex-key west capixaba, a Barra do Jucu, agoniza em seus estertores.
O que está sendo chamado de “Orange Park” é um projeto de ocupação urbana cuidadosamente discutida com o Ministério Público na gestão anterior, exatamente para que ali não se reproduza uma arcaica percepção de êxito com a industrialização de base urbana. Camburi sabe bem o que é isso. Anchieta e Ubu, provavelmente saberão em pouco tempo. Hoje não exploradas, o que é melhor que mal exploradas, amanhã deixarão de ser dormitórios. Para dissabor da natureza, pródiga na ocupação territorial em nosso Estado.

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