Thursday, February 18, 2010

Montanhas


A subida para as montanhas, ao sul do Espírito Santo, ainda é a mesma. A estrada sinuosa, a bica com água pura, as curvas perigosas e o calor ficando para trás a cada momento. Mas algo mudou. Tem mudado. Antes, havia um verde mais denso que as cobria como um manto tecido à mão divina, com fibras naturais. Hoje nada mais há, em muitos locais, que a monotonia da coloração eucalíptica. Pastagens, cafezais e outras culturas que remontam à nossa colonização desaparecem ou agonizam em lamentações crescentes e as políticas públicas fingem não ouvir. Atraída pelas indústrias urbanas, a força de trabalho rural remanescente é insuficiente para fazer girar a roda da produção rural. Uma produção que gera emprego, além de manter e valorizar a cultura local com seus princípios e valores. Muitos países e regiões não só valorizam essa atividade rural, como grande parte da Europa e dos Estados Unidos, mas também agregam atividades econômicas como agro-negócio, turismo e centros de pesquisas acadêmicas. Como pensou Augusto Ruschi tempos atrás para Santa Tereza. Bem como Kautsky, com suas orquídeas.
É uma equação simples: manter a produção rural emprega pessoas, essas não migram e não promovem ocupações irregulares nos centros urbanos. Onde passam a viver, de modo geral, em condições deploráveis em termos de saúde pública. Favelas e bolsões de pobreza com violência e comércio de drogas desceram dos morros e se esparramam em ocupações horizontais. O crescimento exponencial da plantação de eucaliptos observada na subida pelas montanhas é uma soma cujo resultado tende a ser zero. Ou mesmo negativo. A pessoa tem uma área, recebe mudas e espera três, quatro ou cinco anos para abatê-las. Então, fazer dinheiro e recomeçar. O solo vai sentindo essa ambição.
Aos poucos, a pequena cidade que hospeda essas áreas perde seu conteúdo significante. Sua identidade. A dinâmica econômica dos cafezais, laranjais, limoeiros e da pecuária reduz-se a velocidade de uma tartaruga. Sem sentido na vida, jovens que ainda permanecem correm o risco de entregam-se às drogas, ao crack e à ociosidade dos pequenos furtos e assaltos. Em pouco tempo seguem para as cidades, em busca do futuro que lhes foi roubado. E tentam roubar o dos outros. Falamos muito da desfiguração do litoral capixaba, seja norte seja sul, que cede lugar aos projetos industriais de grande porte. Mas é preciso ficar de olho bem aberto e atento ao que está acontecendo com a agricultura capixaba e sua alta fragilidade.
Hão de dizer que estão sendo implementados os arranjos produtivos. Mas, é nítido o descompasso entre o que se investe e se atrai de investimentos para a agricultura em relação ao que se atrai para a indústria.

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